Teratogenia da vitamina A
Há evidências de que a vitamina A em excesso durante as primeiras semanas de gestação é teratogênica em humanos. A ação teratogênica da vitamina A tem sido demonstrada em várias espécies de animais. O tipo do defeito no entanto, depende da quantidade de vitamina A, bem como, do estágio gestacional em que a vitamina A é administrada. As anormalidades encontradas em crianças foram devidas a níveis significativamente altos de retinol no soro de mães após o consumo excessivo de vitamina A.
Qualquer efeito teratogênico atribuível a ingestão de vitamina A deve estar diretamente relacionado a oscilações na concentração de retinol sérico materno, como acontece com o consumo de uma cápsula de 200.000UI de vitamina A, desde que a vitamina alcance o embrião ou o feto através do sangue materno. Por causa da teratogenicidade da vitamina A em animais e da isotretinoina em humanos, a vitamina A (não o β-caroteno) tem sido considerada teratogênica. Há evidências de má-formação em crianças, quando as mães consomem altas doses de vitamina A durante a gestação (>25.000UI/dia).
A Organização Mundial da Saúde recomendou a redução da exposição de mulheres grávidas a altas doses de vitamina A na forma de suplementos. As recomendações estão embasadas nos estudos de Mills et al.24 e Oakley e Erickson,25 que orientam, durante a gestação, o uso de multivitamínicos a base de β-caroteno, corroborando o recomendado desde 1987 pelo Centro de Controle da Sociedade de Teratogenia.
Altas doses de vitamina A têm potente efeito teratogênico em animais, sendo contra-indicadas durante a gravidez. Este alto potencial teratogênico justifica a precaução na indicação da vitamina para mulheres em idade fértil. A captação do retinol pelos tecidos é facilitada pelo complexo RBP - retinol, no entanto este mecanismo pode ser ultrapassado quando altas doses de vitamina A são consumidas.
Se o retinol circulante materno for controlado homeostaticamente após o consumo do alimento fortificado com vitamina A, assim como ocorre após o consumo do alimento fonte de vitamina A, como fígado, por exemplo, esta seria uma indicação de que não há risco de teratogenia com alimentos fortificados. Em relação à espécie humana, são raros os dados, sobre uma associação direta entre anomalias do desenvolvimento do embrião e o consumo por gestantes, de doses elevadas de vitamina A pré-formada sob a forma de retinol, ou ésteres de retinil, no início da gravidez.
Os efeitos teratogênicos da vitamina A ocorrem pela presença dos metabólitos, ácido transretinóico, ácido 13-cis retinóico e dos seus oxiderivados. Têm sido estudados os casos de mulheres que receberam doses elevadas desses derivados no decorrer das seis primeiras semanas de gestação. A partir desta idade gestacional não há dados que justifiquem a associação entre a suplementação com vitamina A e teratogenia fetal.
Os estudos experimentais mostram o efeito teratogênico direto do ácido retinóico (trans, 13-cis, 4-oxo-trans, 4-oxo-13-cis) e não do retinol. Os riscos do aporte excessivo à mãe referem-se essencialmente aos suplementos que aumentam a concentração de ácido retinóico no soro da mãe, e não aos que aumentam a concentração de retinol ou ésteres de retinil.
A administração de doses terapêuticas diárias de vitamina A desencadeia picos de concentração sérica de isotretinoina acima de 200ng/mL e taxas endógenas entre 1 a 4ng/mL. A isotretinoina é o ponto de origem de um quadro característico de abortos espontâneos, de partos prematuros e de malformações, afetando o sistema nervoso central, o desenvolvimento craniofacial ou o do sistema cardíaco.
É geralmente aceito que o retinol e seus metabólitos não têm efeitos teratogênicos em concentrações séricas fisiológicas e que o ácido retinóico desempenha um papel essencial na regulação de numerosos aspectos da embriogênese normal. Os dados experimentais indicam que a concentração de ácido retinóico no embrião determina, ao menos parcialmente, a especificidade do poder de regulação genética que se atribui ao ácido retinóico.
Há evidências de efeitos tóxicos de um consumo excessivo de vitamina A pré-formada para o desenvolvimento do embrião. Pelo menos seis relatos de caso, relativamente completos, foram publicados sobre acontecimentos desfavoráveis da gravidez, associados à ingestão diária de 25.000UI de vitamina A pré-formada. Estes relatos destacam um número inesperado de anomalias do aparelho urinário.
Estudos de coorte sobre a utilização de vitamina A durante a gestação têm sido apresentados de forma sucinta. Em um, desses estudos, não houve aumento do número de malformações entre as crianças nascidas de mães que receberam complexo vitamínico contendo 6.000UI de vitamina A pré formada. Outro estudo foi dirigido a um grande coorte de mulheres acompanhadas durante vários anos, e que frequentavam um centro médico para diagnóstico pré-natal. Em numerosas análises sobre suplementação, o consumo de mais de 10.000UI de retinol foi considerado como uma forte exposição à vitamina A. Dez casos de má formação foram registrados no grupo que recebeu dose mais elevada. Os autores demonstraram que a prevalência das malformações cranianas entre as crianças nascidas de mães que receberam quantidades superiores a 10.000UI/dia, ultrapassava 1,7 % do total dos nascimentos.
Em virtude do efeito teratogênico do ácido retinóico em doses terapêuticas, no homem, parece lógico supor que suplementos de vitamina A pré-formada tenham efeito teratogênico a partir de dosagem ainda desconhecida. Os estudos descritos acima procuram determinar esta dose máxima, qualificando como dose elevada uma quantidade superior a 10.000UI de vitamina A pré-formada, por dia.
Estudos recentes parecem indicar que suplementos de até 10.000UI de vitamina A por dia associada a outras vitaminas, reduzem o risco de má-formação quando administrados no período que precede ou sucede a concepção. Embora um bom número de estudos sobre o efeito teratogênico da utilização da vitamina A apresentem limitação metodológica, a maioria dos dados disponíveis não permite afirmar que a dose crítica é de 10.000UI/dia.
Parece altamente improvável que o consumo de suplemento de vitamina A pré-formada, nas doses unitárias habituais, tenha efeito teratogênico no homem.
Fonte: CHAGAS, M. H. C.; FLORES, H.; CAMPOS, F. A. C. S., SANTANA, R. A.; LINS, E. C. B. Teratogenia da vitamina A. Rev. Bras. Saúde Matern. Infant, 2003.